O Fundo do Poço

O fundo do poço


Quarta, 23 Junho 2010 13:22
  

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Os últimos meses têm trazido notícias
no mínimo preocupantes para o futsal português. Os optimistas dirão o
contrário, falarão de um vice-título europeu e de uma Uefa Futsal Cup
vencida pelo SL Benfica. Os realistas, sabem que estamos a viver um dos
piores, senão o pior momento da – curta – história da modalidade.

Há jogos que se não terminam, há
relatos quase semanais de episódios de agressões na quadra e fora dela,
há inúmeros casos de salários por pagar e clubes a fechar portas em
catadupa, mesmo com campeonatos a decorrer. E há, acima de tudo,
demasiada gente mal-formada e incompetente em cargos que lhes deveriam
estar vedados. Um reflexo, talvez, de um problema geral da sociedade
portuguesa, mas que mesmo assim não deixa de ser preocupante.

A fábula da modalidade em crescimento,
do fenómeno em expansão, do desporto do futuro, está a cair, dia-a-dia,
de uma forma verdadeiramente agonizante para quem verdadeiramente se
importa com o futsal.

Fala-se à boca cheia de projectos, não
sabemos se com ingenuidade ou com ridícula convicção. Contam-se pelos
dedos de uma mão os reais projectos futsalísticos deste país. Aqueles
que compreendem a formação de atletas desportivamente aptos,
socialmente disponíveis e academicamente responsáveis. Aqueles que não
são meras tentativas de dirigentes cheios de vontade de gerar a ira
rival num mano-a-mano a ver quem consegue ter mais escalões. Pouco
importa se treinam uma vez por semana, se jogam num ringue de cimento,
à chuva, se os treinadores foram pescados no
ranking-dos-adeptos-ou-familiares-que-vêem-mais-jogos. Perfil
táctico-técnico e humano adaptado à cultura do clube e aos seus
objectivos a médio/longo prazo? Modelo de jogo? Para quê? O que importa
é ter mais e mais e mais! “Como” é uma palavra que neste caso não passa
disso mesmo, duma palavra – e por sinal bem desinteressante!

Qual é o espanto perante este estado
das coisas quando o “exemplo” vem de cima? Quando, em plena 1ª divisão
nacional, há jogadores a mandar em treinadores – não fomos nós que
ouvimos, foi o país inteiro! -, há clubes a faltar aos compromissos, há
violência, há incompetência latente e pouca vontade de mudar. Os
jogadores ainda se vão alterando – entenda-se, são pessoas diferentes,
os vícios permanecem -, o resto caminha para uma putativa candidatura a
Património Mundial da Humanidade. Como se houvesse, por exemplo, uma
regra federativa que obrigasse os clubes da 1ª divisão a contratar
técnicos de entre uma bolsa de 10 a 12 nomes. Se a experiência fosse
boa, óptimo, senão fazia-se um período de nojo no clube do vizinho ou
emigrava-se e depois lá se voltava sob a velha máxima “amigos como
dantes”.

Os dirigentes, quer nos clubes quer a
nível federativo, também vão sendo os mesmos. Os mesmos que sabemos –
porque eles não conseguem e não querem esconder – que não gostam de
futsal e que vivem frustrados por não estarem a ver vinte e dois
senhores na relva. Os árbitros continuam a sair à pressa de cursos
encurtados, sem aulas práticas e sem bom senso, tudo porque são
precisos para servir uma modalidade em pseudo-expansão.

A ilusão está a acabar ou mesmo
acabada. O futsal português está em decadência. Não há peneira
suficientemente capaz de o esconder. E no dia em que se fala de um
treinador habilitado apenas para orientar distritais como possível
candidato a um posto de seleccionador nacional – ainda que adjunto, o
espanto só se pode transformar em revolta.

Admitir, meramente
por hipótese, trocar um seleccionador nacional da craveira de Orlando
Duarte – ainda que se avente o nome do compente Prof. Jorge Braz para
ocupar o seu lugar no topo da hierarquia técnica das Quinas – por um
excelente ex- atleta que enquanto treinador ainda tem muito a provar
(além de aprender que justificar permanentemente os desaires com
arbitragem não é o melhor marketing pessoal), não nos pode deixar
optimistas para o que aí vem. A selecção precisa de líderes, de reunir
o melhor que há no país. De reunir competência. Táctica, técnica,
psicológica. Científica, filosófica e metodológica. Confessamos não
imaginar André Lima – com o respeito que nos merece e que aqui não é
posto em causa – a orientar palestras destinadas a outros treinadores
como fizeram, na última dezena de anos, Braz e Duarte. Confessamos não
imaginar André Lima ao lado de um Venancio Lopez, de um PC ou de um
Ferretti como vimos Braz e Duarte.

A motivação de um grupo
depende, em grande parte, do reconhecimento das capacidades de um líder
e, também, do seu carisma. O sucesso de um país depende da sua
capacidade para reunir, nas suas elites, figuras inspiradoras, capazes
de traçar e executar planos estratégicos que influenciem positivamente
o povo. Tal como o sucesso de uma modalidade depende de reunir essas
figuras influenciadoras dos demais agentes desportivos. Quando se vê
uma tamanha falta de qualificação – científica e humana – dos quadros
dirigentes e técnicos – para não falar de pseudo-meios de comunicação
social que fazem vida à custa de fóruns anónimos que convidam à injúria
e difamação da honra e dignidade alheia, não é de estranhar que
continuemos a ter, nos próximos anos, milhares de jogadores que o
podiam ter sido. Na verdadeira acepção da palavra.

Não tenhamos medo de o admitir: batemos no fundo do poço. E ao que parece, vamos continuar a descer.

Francisco Fardilha
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Tiago Madureira
madureiratiago@hotmail.com Este endereço de e-mail está protegido de spam bots, pelo que necessita do Javascript activado para o visualizar

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